Do tempo do não registo, de crescimento, de sorrisos. Do tempo dos dias grandes, e do corre corre de todos os dias. Do tempo em que inesperadamente, tão sem aviso como a chuva que acontece no Verão, todos os caminhos se desenham com cores novas. Estas cores que hoje são as que pintam os nossos tempos para ser.
Pensei-me doente, tão cheia de pouca energia, tão avessa à luz dos dias. A descoberta foi tardia, face ao inquestionável, ao evidente, ao enjoo compulsivo, impossível de controlar. Já se contavam quase 11 semanas de uma nova vida, aqui tão dentro, deste ventre esquecido de si. De uma mãe já mãe, e não mãe para o futuro, não para o futuro tão próximo, agora que os projectos se costuravam nas malhas dos meses vindouros. Não neste futuro tão incerto, tão difícil, parecia o choro face ao acontecido querer dizer.
Num instante, breve quanto a folha que a brisa segura até cair, o futuro redesenhou-se, ganhou outros contornos, adelgaçou a cintura, e dando ordem ás pernas que caminham, cruzou as novas ruas com passos, primeiro tímidos, ganhando segurança e agora , ainda que ansiosos pela vida, já certeiros e decididos.
Aqui nos encontramos, neste novo mundo de esperanças. Neste milagre acontecido, aqui tão dentro que demorou a revelar. Neste espaço de outro mundo, pedaço de mim, que já não sou eu mas sim um outro.
João confunde as palavras, quer espreitar para esse novo mundo, confunde mano com Dudu, seu mano grande, e diz dizer que no ventre tenho um Dudu assim bebé pequenino.
Para o Natal teremos este belo presente, este que cresce devagarinho e já é tão nosso.
Quis o destino que também não fosse fácil desta vez, mas a ansiedade já aprendeu a se dominar face às contrariedades. Chamados para a amniocentese, depois de um rastreio com índice positivo, esperaremos ainda mais uma semana pelos resultados que confirmarão, ou não, as hipóteses não desejadas. Até lá, mais uma espera, que o tempo, sempre sábio, traga ventos de boa fortuna, de saúde, e de dias risonhos e redondos.
O João, sempre dono desta fábrica, está reguila e cada vez mais senhor do seu destino, esta semana, numa queda empurrada partiu o bordo dos dois dentes da frente modificando o sorriso dele e o nosso. Já não usa fralda durante o dia, e já não acontecem deslizes, o processo demorou largos meses, mas finalmente o sucesso. O sorriso, o cheiro, os seus mimos, são o que me dão mais força em todos os dias. Sabê-lo carne que saiu de mim, e que agora brilha e cintila no seu próprio horizonte.
Em breve seremos cinco, um redondo cinco, um imenso cinco.
Uma família como sempre admirei, mas nunca julguei que fosse a minha.